quinta-feira, 11 de agosto de 2016

O “Pokemon Go” que existe em todos nós

Era inevitável tocar nesse assunto. Não porque todos o estão fazendo, mas porque se trata de um fenômeno bastante interessante e, como sempre, passível de algumas análises…

A “febre” deste jogo nos mostra coisas essenciais sobre o nosso funcionamento psíquico. A começar pela insatisfação crônica que nos define e a necessidade incessante de adquirir algo que não temos.

Nós, como sujeitos, somos constituídos pela falta. Desde que percebemos que não somos onipotentes e que o eixo de rotação terrestre não se dá ao redor de nossos umbigos, como acreditávamos quando bebês, nos deparamos com a dura realidade de não ter aquele conforto e prazer que sentíamos na fase áurea dos primeiros anos de vida, em que contávamos com todo o cuidado necessário para que nossa vida pudesse acontecer. Acreditávamos ser o mundo inteiro para alguém. Quando caímos na real, nos damos conta desse sentimento de desamparo causado pela perda de um ‘poder absoluto’ e nos vemos obrigados a buscá-lo em outras figuras por aí. Daí é que surgem os nossos desejos. É a falta que cria o desejo.

Para preencher esse vazio existencial que nos habita, oportunidades é que não faltam. A sociedade do consumo que se instalou nos tempos modernos está, a todo momento, nos apresentando milhares de formas de tapar o buraco. Cada um escolhe as suas maneiras de buscar essa completude. Pode ser a comida, as compras no shopping, o carro, o esporte, o trabalho, as drogas. Já inventamos milhares de opções para nos satisfazer. Capturar Pokemons é só mais uma delas. Elas envolvem o prazer, a satisfação, o controle, a competição e o desejo de ter mais, que, por vezes, pode se tornar compulsório. E todas elas têm o efêmero como condição existencial.

Em termos de massa, a cada fase que passamos, nos deparamos com novos tipos de “buracos sociais”, que vão modificando seus formatos. Mudam-se as épocas, mudam-se as necessidades.
Um jogo que faz com as pessoas circulem pelos espaços públicos parece estar respondendo a uma demanda social de interação. As pessoas se movimentam e se encontram, mesmo que estejam vidradas no celular. Traz um pouco da realidade e tira um tanto do peso de um sedentarismo daqueles que jogam video games na televisão ou mesmo nos aparelhos móveis, mas permanecem estáticos. Ou até mesmo para aqueles que simplesmente não saíam de casa. São inúmeros os casos sobre o que o jogo tem feito, de bom e de mal, com os usuários.
Os mais jovens sentem-se bem ao fazer parte da massa, da rede conectada. Os menos jovens sentem-se bem ao fazer parte do que se liga à juventude. É inclusivo e acessível, o que o faz encaixar-se perfeitamente dentro da lógica do consumismo.

Poderíamos prolongar muito mais as reflexões acerca de todos esses vícios que nos fisgam disfarçadamente. Sem contar com as teorias conspiracionistas que vivem nos assombrando. Mas o ponto principal é justamente fazer com que fique clara a ideia de que nada do que está fora pode nos preencher. O vazio, a falta, o buraco só deixam de causar sofrimento se acolhidos por nós mesmos, pelo nosso próprio afeto e por meio de recursos psíquicos, que são internos. São eles que vão nos fazer aceitar aquela dura verdade, que continuará existindo por toda a vida. Vão nos fazer entender que não chegaremos a tão desejada completude, e que isso é bom. Precisamos do desejo para viver.

E, já que essa busca é eterna, o que podemos fazer é pensar sobre o que escolhemos como representantes da nossa satisfação, de forma que cause resultados melhores para nós e para o mundo.